domingo, 23 de dezembro de 2007

Inútil invocar o belo

Sou um criminoso por às vezes
me esquecer do belo
e de por vezes, o relegar às sombras
Então, afogo-me como quem se afoga
com água pelo tornozelo
e vejo ogres ominosos
onde apenas pairam pombas

Isto acontece, talvez, porque ao belo
não basta desejá-lo,
não está sempre ali à mão,
não vem quando se chama,
não se controla, não se comanda
Cumpre-lhe apenas existir
e ser cobiçado pela vontade humana

Por isso é triste todo o que invoca o belo
porque é a ausência dele mesmo nessa oração
Ele não possui sequer a morada que lhe deram
Uma cirurgia de peito aberto
mostra que não mora no coração
Porque o belo é novo rico
que se envergonha das suas origens
e tal como ele, sente nauseas, vertigens
sempre que encara o feio, seu irmão

Por isso, quem sabe isso
não espera mais o belo
Pega em papel de lustro e numa tesoura
e faz uma fantasia de carnaval.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007

Dioptrias

Quando olho para ti
vejo um medo
E quando olho para ti,
uma esperança
E esse medo e essa esperança fundem-se
no teu olhar quando olhas para mim

Quando olhas para mim
vês um sonho
E quando olhas para mim,
um pesadêlo
Esse pesadêlo pede-te que olhes por mim
e esse sonho que olhemos para o amanhã

Quando olhamos um para o outro
petrificamos
E quando olhamos um para o outro
derretemos
E de repente esquecemos, sonegamos
que há outros que olham para nós.